Quais os cuidados para diminuir a deriva da aplicação de defensivos agrícolas?

Deriva Cultivar

Eng° Agr° M.Sc. Henrique Borges Neves Campos, Prof. Dr. Marcelo da Costa Ferreira e Eng° Agr° M.Sc. Dieimisson Paulo Almeida

Os produtos fitossanitários são ferramentas importantes na agricultura há décadas, promovendo o controle de pragas, doenças e plantas daninhas, garantindo que o potencial produtivo dos cultivos seja alcançado para atender a demanda por alimentos de uma população em constante crescimento.

O marco inicial do uso destes compostos químicos na agricultura ocorreu em 1931 com a introdução da molécula sintética do herbicida DDT (diclorodifeniltricloroetano). Posteriormente, deu-se início a “Revolução Verde” em 1950, e os processos tradicionais de manejo na agricultura foram modificados drasticamente.

O ritmo da demanda por alimentos tornou-se dependente dos agrotóxicos. Entretanto, apesar de importantes, a sua aplicação deve ser consciente. A intitulação do Brasil como maior consumidor de agrotóxicos no mundo pela ANDEF em 2009 expõe o grave problema que o sistema de produção brasileiro enfrenta com relação ao uso sustentável destes.

Neste contexto, a tecnologia de aplicação de produtos fitossanitários desempenha um papel essencial. A tecnologia de aplicação pode ser definida como o emprego de todos os conhecimentos científicos que proporcionem a correta colocação do produto biologicamente ativo no alvo, se necessário, na quantidade requerida, de forma econômica e com o mínimo de contaminação de outras áreas. Este campo é um dos mais multidisciplinares dentro da agricultura, uma vez que considera aspectos da biologia, química, engenharia, ecologia, sociologia, economia e eletrônica.

O que se observa no campo é que, geralmente, dá-se muita atenção ao produto fitossanitário a ser aplicado e pouca à técnica de aplicação. Entretanto, conhecer a forma de aplicação que proporcione melhor uniformidade de distribuição de calda e tamanho de gotas adequado permite que o produto alcance o alvo de forma eficiente e que perdas sejam minimizadas.

A escolha e o uso adequado de modelos de pontas de pulverização constituem passos importantes para a melhoria das condições de precisão e segurança na aplicação dos defensivos. De acordo com pesquisas, a seleção apropriada de pontas é essencial para a eficácia no tratamento fitossanitário, sendo o fator determinante da quantidade aplicada por área, da uniformidade de aplicação, da cobertura por gotas e, principalmente, do risco potencial de contaminação humana e ambiental por deriva.

A deriva é o movimento de um produto no ar durante ou depois da aplicação para um local diferente do planejado, ou seja, é tudo aquilo que não atinge o alvo durante a aplicação. Também se define deriva pela parte da pulverização agrícola que é carregada para fora da área alvo pela ação do vento. Assim, este desvio de trajetória que impede que as gotas produzidas atinjam o alvo está relacionado diretamente ao tamanho de gotas produzido pelo modelo de ponta de pulverização e às condições ambientais no momento da aplicação.

Pontas de pulverização que produzem gotas muito finas (esta informação é apresentada na tabela de vazão da ponta) representam maior risco de deriva. Em contrapartida, pontas que produzem gotas grossas diminuem este risco. Com o objetivo de reduzir a deriva e melhorar a qualidade das aplicações, fabricantes de pontas de pulverização desenvolveram os modelos com indução de ar, popularmente chamados de “anti-deriva” ou “bicos de espuma”. Estas pontas têm em comum a produção de gotas grossas.

Para a escolha da ponta de pulverização adequada devem ser considerados alguns fatores, por exemplo: a característica do produto que será aplicado (sistêmico ou contato), o problema fitossanitário (praga, doença ou planta daninhas), presença de culturas sensíveis ao produto aplicado em áreas adjacentes e, principalmente, as condições meteorológicas no momento da aplicação.

De modo geral, recomenda-se que as aplicações de defensivos agrícolas sejam realizadas quando a temperatura ambiente for menor que 30°C, a umidade relativa do ar maior que 50% e ventos com velocidade entre 3 e 7 km/h.

A deriva de uma aplicação pode ser quantificada pela deposição da calda aplicada em coletores. Tal como adicionando marcadores metálicos à calda, sendo possível realizar sua extração e recuperação posteriormente. Entretanto, países europeus têm adotado a norma ISO como padrão para a quantificação de perdas nas aplicações, em que são utilizados marcadores fluorescentes.

A busca por maior rendimento na quantidade de hectares tratados por hora impulsionou o uso de barras de pulverização de maior largura, assim como o incremento na velocidade de deslocamento de pulverizadores. No entanto, estudos mostram que todas estas tendências aumentam o risco de deriva.


Característica da aplicação com diferentes pontas de pulverização

Seguindo o raciocínio que os pulverizadores têm a barra de pulverização suportada por um quadro oscilante, que por sua vez é conectado a um quadro fixo, e que durante a aplicação o pulverizador translada em solos irregulares, movimentos horizontais e verticais podem ocorrer na barra de pulverização. Estes movimentos são chamados tecnicamente de oscilações, e influenciam diretamente no risco de deriva de produto para o ambiente.

As oscilações horizontais fazem que a barra, vista de lado, oscile no sentido do avanço e contrário ao equipamento, resultando em faixas intercaladas de sub e sobredosagens do produto. Já as oscilações verticais fazem que a barra, vista por trás, oscile para cima e para baixo em movimento de rotação, provocando desuniformidade na distribuição da calda pela proximidade dos bicos com o solo, além do risco de impacto e quebra da estrutura.

A oscilação vertical de barra tem sido a principal responsável por deriva nas aplicações. A exposição do jato de calda a distâncias maiores das recomendadas em relação ao alvo expõe gotas de menor tamanho, peso e velocidade de deposição ao arrasto pelo ar circundante. Em pontas de pulverização com 110° de ângulo de jato aspergido (Vide codificação inserida na ponta) recomenda-se 0,5 m de altura da barra em relação ao alvo e de espaçamento entre os bicos. Atendidas estas condições o risco de deriva é menor.


Influência da ponta de pulverização no arraste de gotas pelo ar circundante devido o deslocamento da máquina

Na prática, nota-se que em função do aumento na velocidade de trabalho do pulverizador nem sempre é possível manter a barra de pulverização na altura recomendada em relação ao solo, mesmo com a variedade de sistemas de suspensão de barras e sensores de altura. Ainda, em áreas com declividade acentuada é praticamente impossível atender às recomendações de altura da barra. Nessas condições, a melhor opção é diminuir a velocidade de deslocamento do equipamento para menor arraste de gotas pelo ar circundante e melhor distribuição do produto aplicado.


Influência da declividade do terreno na altura da barra de pulverização

Embora já verificado em estudos realizados na década de 70 que as oscilações aumentam com o incremento da velocidade de deslocamento do pulverizador e comprimento da barra, no País existem diferentes médias de velocidade em função das possíveis adversidades do relevo na área de aplicação e do equipamento. No Estado do Mato Grosso, nas extensivas áreas planas cultivadas com soja, algodão, entre outras, predominam os pulverizadores auto-propelidos com barras de 30 m de largura em velocidades de até 30 km h-1. Tais condições podem ser consideradas ótimas do ponto de vista operacional, mas do ponto de vista técnico tem-se o risco de deriva.

Contudo, eliminar completamente o risco de deriva nas aplicações de defensivos agrícolas é praticamente impossível, mas com a multiplicação de informações técnicas é possível minimizá-lo. Deve-se considerar que as perdas nas aplicações estão relacionadas às condições climáticas, a combinação entre topografia da área a ser tratada e velocidade de trabalho, calibração e regulagem do equipamento aplicador e, o fator mais importante, o conhecimento técnico do operador da máquina. A sustentabilidade econômica, ambiental e social no uso de defensivos depende do treinamento dos indivíduos envolvidos no processo de pulverização, pois não há aplicação 100% se o profissional responsável não é capacitado.